segunda-feira, janeiro 25

O exemplo do Orçamento


A aprovação do Orçamento de Estado parece estar no bom caminho. Independentemente de todas as dificuldades que cada cidadão português possa ver nele para a sua vida pessoal e profissional neste ano de 2010. Os tempos estão difíceis e era inaceitável o nosso quadro Parlamentar não conseguir chegar a acordo para a aprovação do Orçamento. É por isso, em nossa opinião, um sinal positivo.

Existe em nós uma dificuldade genética para a negociação e partilha de poder ao nível institucional e mesmo entre indivíduos. A vida democrática contemporânea faz-se de parcerias e compromissos. Sem elas existe uma enorme dificuldade em tornar operacional qualquer realização: das governativas às empresariais, das desportivas às científicas. Ficamos satisfeitos com o novo clima político que permitiu este compromisso (sem histerias ou chiliques) e que tanta falta faz até como um bom exemplo da política para a restante sociedade.

Com isto não estamos a defender ausências de crítica ou necessidade de marcação de diferenças. Mas temos alturas para tudo e, dentro das diferenças, a responsabilidade de quem tem de dirigir impõe a criação de entendimentos para que os países e as sociedades avancem e não fiquem bloqueadas.
Só ser possível avançar quando alguém detém o poder “absoluto” não é próprio do século XXI. É necessário saber fazer partilhando tarefas e responsabilidades entre o maior número e não estar à espera de líderes providenciais ou totalitários que só geram cidadãos dependentes e medíocres. A responsabilidade partilhada é um bem que temos que valorizar mesmo que muitas vezes isso dê muito mais trabalho e deixe muitos não completamente satisfeitos. Mas a vida em sociedades maduras só pode ser assim, responsável e tolerante e dessa forma capaz, de forma pacifica e civilizada, desbloquear os problemas que se vão colocando.

O Orçamento de Estado poderá proporcionar sem dramas o necessário andamento ao Pais. Não agradará a todos mas reflectirá o conjunto de opções de uma larga maioria plural de portugueses que não querem que os políticos lhe criem mais problemas mas que lhos resolvam.

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quarta-feira, janeiro 20

O frio relativo...

Hoje vinha publicado na imprensa uma notícia que referia que cerca de um terço dos portugueses não tinha meios para manter a casa quente, sendo da Europa o país pior preparado para as baixas temperaturas *. Estes resultados são bem reais. Vemo-nos como um País temperado e, talvez por isso, fartamo-nos de passar frio.

Esta notícia fez-nos lembrar quando há uns anos pela primeira vez fiz uma viagem ao centro da Europa e calhou logo no mês de Dezembro. Nessa altura pensei que me teria de preparar o frio pois a meteorologia assim o recomendava. Puro engano. Fizemos toda a vigem no maior dos confortos só sentindo alguma dificuldade se passássemos demasiado tempo na rua. Mas mesmo assim logo que entravamos num espaço interior tudo se recompunha tendo muitas vezes de reduzir a indumentária à camisa. Mesmo nos cafés.

Toda a viagem foi feita no maior conforto térmico. Lembramo-nos perfeitamente quando voltámos a sentir frio... Só no regresso a Portugal. Nessa altura, nos finais dos anos 80, o País estava muito diferente e de lá para cá muito mudou. Mas nesse ponto ainda temos muito caminho a fazer. Apesar de as novas construções estarem mais preparadas fruto dos regulamentos térmicos entretanto criados, o velho parque habitacional continua essencialmente na mesma. Passar frio por termos um clima moderado já não parece chegar como justificação. A Pobreza parece ser agora (como antes) a razão.

*Estes resultados foram revelados na análise sobre a taxa de privação material, um indicador que o Comité de Protecção Social criou para medir a exclusão social (divulgados pelo Eurostat) para a conferência de abertura do Ano Europeu de Combate à Pobreza e à Exclusão Social.

terça-feira, janeiro 5

O "povo" Português e a educação


A relação dos Portugueses do “povo” com a educação merece reflexão. Vem hoje referido no Jornal Público que o “abandono escolar acompanha os Portugueses”. A constatação vem de para além de sermos o segundo País da Europa com maior abandono escolar, esta fatalidade acompanha a nossa comunidade lusa emigrante. Ou seja, mesmo emigrados os filhos dos portugueses têm um abandono superior e piores resultados escolares que os nativos.

A escola e a educação parecem não ser vistas como factor a valorizar por parte das famílias bastando para estas que os filhos sigam os trilhos traçados pelos pais e para isso não foi necessário estudar para além do estritamente necessário. Não é de estranhar.

Durante séculos a erudição era coisa de ricos ou de padres. Gente que vivia do trabalho do povo. Este, por isso, não necessitava dos estudos para fazerem aquilo que o destino lhes tinha encarregado de fazer: servir e sobreviver. Passando ao lado da modernização dada pela industrialização, dos conflitos mundiais, sem crises de identidade nacional ou religiosa a educação do povo pareceu, a todos, coisa desnecessária. Quer aos próprios, quer ao Estado. Não por estupidez como se poderia pensar à partida mas por um profundo sentido prático: para quê perder tempo inutilmente?

Mesmo com os progressos verificados a partir dos anos 60 esta percepção mudou pouco. A mobilidade social praticamente inexistente até então, conseguida apenas pela via militar ou religiosa, atinge só uma magra camada da classe média emergente de então para cá. Tendo um mundo fora do País, historicamente os portugueses resolveram sempre os seus problemas económicos, não por via revolucionária ou desenvolvimentista, mas saindo de cá. Ou para o Império ou como emigrantes. Assim, estudar para quê?

As primeiras gerações de emigrantes vindas do povo que saiu por falta de alternativas sofrem, ainda hoje, da mesma percepção que os que cá ficaram sem alternativas. Não existe necessidade de se educarem para fazerem aquilo que os espera, que é o mesmo que a seus pais. Quando esta percepção mudar a educação será valorizada por ser útil. E isso só pode acontecer quando o nosso País se tornar mais aberto à sociedade do conhecimento e mais meritocrata, premiando pelo valor individual mais do que pela condição de proveniência. Sem estas mudanças dificilmente os Portugueses do povo mudarão a sua relação com a educação. Alguns passos estão a ser dados nesse sentido mas muito ainda falta fazer.

segunda-feira, janeiro 4

Desejos para 2010 e seguintes

Um dos desejos que temos para 2010 e para a década que se segue implica a mudança de perspectiva sobre o desenvolvimento territorial. Durante muitos anos, acentuado pelo atraso estrutural do País, a grande aposta foi a infra-estruturação do território. Este esforço, por si, faria com que o desenvolvimento chegasse por indução do “hardware”. Considerou-se que o “software”existente chegava bastando ser expandido. Foi um erro.

A infra-estrutura melhorou bastante e foi importante para assegurar o início da mudança, mas essa é, apesar de tudo, a parte mais fácil. Fazer o resto é mais demorado. Como a mudança foi muito acelerada as pessoas e os procedimentos mantiveram-se os mesmos. Conservando o “software” ele chega a um ponto de esgotamento onde já não produz mais nem melhor. Pode-se até aumentar o “hardware”mas o que se observa é a continua incapacidade de progressão e adaptação aos novos desafios. Quando isso acontece começamos a ter a sensação de estar a andar para trás porque tudo o resto avança muito depressa.

Mas por força da internacionalização da economia alguns sectores avançaram mais depressa e dentro de cada um deles, uns mais que outros. Assim quando olhamos vemos um País a duas velocidades. Nas áreas mais protegidas da concorrência (ou mesmo fora dela) sentimos regressão noutras, mais expostas, grande transformação. Mesmo nos serviços do Estado vemos grandes assimetrias e, por vezes, em serviços equivalentes. Não é difícil encontrar dentro da mesma universidade pública centros de excelência e outros completamente “esclerosados”,tal como serviços de saúde de ponta a conviverem lado a lado com as rotinas médicas mais ultrapassadas, só para dar dois exemplos.

Por ter sido tão rápida a transformação muitos de nós continuam a acreditar que o desenvolvimento necessário virá por via de um aumento da infra-estrutura pois foi através dela que melhorámos a nossa qualidade de vida. Mas esta crença tem levado a investimentos errados porque desnecessários ou mal dimensionados. Acredita-se que este induz sempre desenvolvimento mas já vamos tendo muitos exemplos que nos demonstram o contrário. Os estádios do Euro 2004 são disso um aterrador exemplo, onde com excepção de dois ou três (os que efectivamente deviam ter sido construídos) todos os outros são insustentáveis sem se saber o que fazer deles. E como os estádios muitas outras com menor dimensão e menos projecção se encontram com o mesmo problema. As próximas décadas serão de encerramento de muitas delas pelo País fora por incapacidade de manutenção. No sector público mas também no privado.

O que necessitamos agora é de investimento no “software” porque o “hardware” disponível, com algumas adaptações pontuais tem capacidade para o suportar mais uns anos. A competitividade dos territórios são essencialmente conseguidos pelas pessoas que têm ou conseguem atrair. Conseguir tornar a sua vida mais fácil para que estas libertem a sua imaginação, recursos e atenção para o que realmente interessa é a mudança necessária. A produção de valor e realização pessoal e colectiva fazem-se capacitando e mudando pessoas e sistemas. O que necessitamos é pôr o que já existe a funcionar em rede aproveitando ao máximo os recursos e infraestruturas existentes tornando-as sustentáveis logo rentáveis. Sejamos inteligentes temos de trabalhar, não mais mas melhor. Não construir mais mas preservar o que temos e melhorar a sua utilização.
Bom 2010.