A propósito do excelente artigo escrito por Helena Matos (HM), hoje no "Observador", ocorreu-nos contribuir um pouco para esta história, escrevendo sobre isso na primeira pessoa. O período retratado por HM é o de entre o 25 Abril de 1974 e o chamado "Verão Quente" de 75, onde os "retornados", como passaram a ser chamados, voltaram de forma mais expressiva. A "ponte aérea" que os fez aterrar massivamente na Portela, não permitiu serem mais ignorados, como tão bem explica HM no seu artigo.
O flagelo da descolonização que fez regressar mais de meio milhão de pessoas em menos de dois anos, funcionou como um início do fim da festa que foi esse primeiro ano de revolução. Mas neste caso as pessoas que voltavam não eram os ricos, filhos de família e/ou oportunistas que se tinham "governado" durante mais de quarenta anos de ditadura e que já tinham sido saneados. Estes eram os seus irmãos, de sangue ou de armas, que voltavam. Mas não deixavam estes de representar uma ameaça. Como representou sempre quase tudo o que vinha de fora ameaçando a miséria que sempre sobrou no Portugal continental. Poucos foram os que voltaram ao pequeno espaço luso metropolitano durante os longos cinco séculos de império. Saiam para não mais retornar.
Mas tendo Portugal ficado, pela primeira vez, confinado ao pequeno retângulo europeu, a estes portugueses em perigo de vida restou, para a grande maioria, retornar. Foi o que fizeram...Mas, inicialmente, com muito pouca visibilidade, pois na grande festa revolucionaria dificilmente cabiam mais deserdados do que os já identificados: os ricos, os oportunista, os bufos, os exploradores e... os colonialistas. Foi, aliás, neste último epíteto, que muitos passaram a colocar os "retornados" do Ultramar. Não fomos, inicialmente bem recebidos, pois para além de sermos muitos e termos perdido tudo, ou quase, passamos a ser uma outra face da moeda boa, que tinha cunhada a queda do Estado Novo. A descolonização foi, assim, uma espécie de culpa velada do novo regime. Do qual nunca nenhum dos envolvidos gostava particularmente de falar.
Pensamos, e para que não fiquem quaisquer dúvidas, que a responsabilidade desta descolonização descontrolada se deveu à falta de realismo histórico do Estado Novo, particularmente a partir dos anos 60.
Assim como temos o orgulho em considerar que um dos grandes feitos do Portugal contemporâneo e dos portugueses nestes últimos 40 anos foi absorver toda esta gente sem terem ficado cicatrizes visíveis. Apesar do manto de silêncio. Sendo, por isso, em nossa opinião um assunto resolvido. Podemos mesmo afirmar que boa parte dos "retornados" e dos seus filhos e netos estão em melhor condição de vida material e sócio/profissional que a maioria dos seus familiares que nunca de cá saíram (dava um bom tema de investigação). O que adquiriram com a mudança de ambiente foi bem mais importante do que aquilo que lá deixaram. Pela observação que fazemos acerca deste tema, há anos a esta parte, assim parece ter acontecido. O que demonstra que mais importante que os bens materiais que se perderam, foram as aprendizagens, o novos horizontes e as novas relações pessoais que a experiência existencial proporcionou. O que só confirma e atesta este sucesso coletivo. No entanto, só agora se começa a ver alguma reflexão coletiva sobre este fenómeno, onde este artigo de HM, a interessante série exibida no ano passado "E depois do adeus", ou "Os últimos filhos do Império" no Público, são alguns bons exemplos.
Não deixa de ser curioso refletir-se sobre a descolonização justamente num novo tempo de "ajustamento" (uma nova forma de viver revolucionariamente sem golpe de Estado) da nossa sociedade e economia. Mas já não acreditamos em coincidências, pois alguma semelhança existe entre estes dois períodos, salvaguardadas as devidas distâncias, claro está.
Uma delas é o desmoronar do mainstream nacional que se constituiu no início do novo regime e que está a perder terreno no país. Sim porque parte do que se vive atualmente está a originar, entre muitas outros efeitos, uma mudança de protagonistas. Uma substituição de elites mas sem golpe de Estado. Mudança imposta de fora mas mesmo assim reformista. A "Geração 25" (G25), como já lhe chamamos, está finalmente a ser substituída. Boa parte desta atingiu, quase sem saber ler nem escrever, ou pelo menos com muito pouca experiência e conhecimento de vida, o poder e os lugares de responsabilidade do Estado, das empresas e da sociedade e só agora está, após mais de 40 anos (novamente esse número cíclico) a começar a sair de cena. Com muita dificuldade mas está. Pois esta geração, ou pelo menos a sua elite aos mais diversos níveis nunca perdeu. Ganhou sempre, uns mais outros menos, uns mais honestamente outros menos, mas foi sempre vencedora. Só agora vê parte dos seus ídolos saírem de cena e com eles desmoronar-se o seu mundo. Sem revolução de forma mais serena mas igualmente real. Mas não irão sair sem dar luta...apesar da falta de dinheiro e a passagem do tempo não lhes seja favorável.
Não deixa de ser interessante que o protagonista mais visível dessa nova mudança histórica seja ele um "retornado". Mas essa parte da história deixamos para mais tarde...agora vamos dar o nosso contributo pessoal sobre a nossa estória de retornado...(continua em Retornados II)
O flagelo da descolonização que fez regressar mais de meio milhão de pessoas em menos de dois anos, funcionou como um início do fim da festa que foi esse primeiro ano de revolução. Mas neste caso as pessoas que voltavam não eram os ricos, filhos de família e/ou oportunistas que se tinham "governado" durante mais de quarenta anos de ditadura e que já tinham sido saneados. Estes eram os seus irmãos, de sangue ou de armas, que voltavam. Mas não deixavam estes de representar uma ameaça. Como representou sempre quase tudo o que vinha de fora ameaçando a miséria que sempre sobrou no Portugal continental. Poucos foram os que voltaram ao pequeno espaço luso metropolitano durante os longos cinco séculos de império. Saiam para não mais retornar.
Mas tendo Portugal ficado, pela primeira vez, confinado ao pequeno retângulo europeu, a estes portugueses em perigo de vida restou, para a grande maioria, retornar. Foi o que fizeram...Mas, inicialmente, com muito pouca visibilidade, pois na grande festa revolucionaria dificilmente cabiam mais deserdados do que os já identificados: os ricos, os oportunista, os bufos, os exploradores e... os colonialistas. Foi, aliás, neste último epíteto, que muitos passaram a colocar os "retornados" do Ultramar. Não fomos, inicialmente bem recebidos, pois para além de sermos muitos e termos perdido tudo, ou quase, passamos a ser uma outra face da moeda boa, que tinha cunhada a queda do Estado Novo. A descolonização foi, assim, uma espécie de culpa velada do novo regime. Do qual nunca nenhum dos envolvidos gostava particularmente de falar.
Pensamos, e para que não fiquem quaisquer dúvidas, que a responsabilidade desta descolonização descontrolada se deveu à falta de realismo histórico do Estado Novo, particularmente a partir dos anos 60.
Assim como temos o orgulho em considerar que um dos grandes feitos do Portugal contemporâneo e dos portugueses nestes últimos 40 anos foi absorver toda esta gente sem terem ficado cicatrizes visíveis. Apesar do manto de silêncio. Sendo, por isso, em nossa opinião um assunto resolvido. Podemos mesmo afirmar que boa parte dos "retornados" e dos seus filhos e netos estão em melhor condição de vida material e sócio/profissional que a maioria dos seus familiares que nunca de cá saíram (dava um bom tema de investigação). O que adquiriram com a mudança de ambiente foi bem mais importante do que aquilo que lá deixaram. Pela observação que fazemos acerca deste tema, há anos a esta parte, assim parece ter acontecido. O que demonstra que mais importante que os bens materiais que se perderam, foram as aprendizagens, o novos horizontes e as novas relações pessoais que a experiência existencial proporcionou. O que só confirma e atesta este sucesso coletivo. No entanto, só agora se começa a ver alguma reflexão coletiva sobre este fenómeno, onde este artigo de HM, a interessante série exibida no ano passado "E depois do adeus", ou "Os últimos filhos do Império" no Público, são alguns bons exemplos.
Não deixa de ser curioso refletir-se sobre a descolonização justamente num novo tempo de "ajustamento" (uma nova forma de viver revolucionariamente sem golpe de Estado) da nossa sociedade e economia. Mas já não acreditamos em coincidências, pois alguma semelhança existe entre estes dois períodos, salvaguardadas as devidas distâncias, claro está.
Uma delas é o desmoronar do mainstream nacional que se constituiu no início do novo regime e que está a perder terreno no país. Sim porque parte do que se vive atualmente está a originar, entre muitas outros efeitos, uma mudança de protagonistas. Uma substituição de elites mas sem golpe de Estado. Mudança imposta de fora mas mesmo assim reformista. A "Geração 25" (G25), como já lhe chamamos, está finalmente a ser substituída. Boa parte desta atingiu, quase sem saber ler nem escrever, ou pelo menos com muito pouca experiência e conhecimento de vida, o poder e os lugares de responsabilidade do Estado, das empresas e da sociedade e só agora está, após mais de 40 anos (novamente esse número cíclico) a começar a sair de cena. Com muita dificuldade mas está. Pois esta geração, ou pelo menos a sua elite aos mais diversos níveis nunca perdeu. Ganhou sempre, uns mais outros menos, uns mais honestamente outros menos, mas foi sempre vencedora. Só agora vê parte dos seus ídolos saírem de cena e com eles desmoronar-se o seu mundo. Sem revolução de forma mais serena mas igualmente real. Mas não irão sair sem dar luta...apesar da falta de dinheiro e a passagem do tempo não lhes seja favorável.
Não deixa de ser interessante que o protagonista mais visível dessa nova mudança histórica seja ele um "retornado". Mas essa parte da história deixamos para mais tarde...agora vamos dar o nosso contributo pessoal sobre a nossa estória de retornado...(continua em Retornados II)
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