sábado, agosto 30

Setúbal capital turística da região Arrábida/Sado

Publicado hoje no Sem Mais encarte do Jornal Expresso no distrito de Setúbal

Não se assustem com o titulo pois não defenderemos a criação de uma qualquer nova região administrativa. Vamos apenas tentar demostrar a necessidade de identificar uma realidade que começa a ter um corpo definido sem, no entanto, ter ainda uma cabeça e uma estratégia que a mobilize e direcione para garantir a sua sustentabilidade. A identificação dessa “cabeça” e a criação dessa estratégia poderá dar um novo sentido a todo um território que evidência uma personalidade própria. Senão vejamos... 

Iremos identifica-lo sob ponto de vista da atividade turística (apesar de outras realidades económicas confluírem na mesma direção) porque nos parece ser uma das melhores formas, mas não a única, de conseguir exportar serviços conservando a população ativa no território, numa das atividades que mais talento temos para fazer: receber bem e oferecer o que nos sobra: património natural e humano e muito sol. Isto mesmo está a ser demonstrado pelo destaque que o país tem tido em todos os rankings e prémios do sector.

O território está identificado há muito, apesar de nem sempre o termos presente. Historicamente, a navegabilidade do rio Sado e a exploração dos seus recursos, constituiu o canal de desenvolvimento, que começou por ter Alcácer do Sal e mais tarde Setúbal, como núcleos urbanos principais. Este espaço cultural e natural, marginado a norte pela serra da Arrábida, separa-o da restante península de Setúbal, onde o rio funciona como elemento de ligação da paisagem e da restante comunidade sadina a sul.

A milenar ocupação humana do distrito de Setúbal, desde os finais do século XIX, tem vindo a consolidar duas zonas principais: a norte o arco ribeirinho sul, que é cada vez mais parte integrante da Grande Lisboa, e a cidade de Setúbal a sul, estando os restantes concelhos Alentejanos em perda populacional, com exceção da cidade portuária de Sines. As vilas de Sesimbra e Palmela, situadas na serra da Arrábida, perdem também alguma população, ainda que os seus concelhos cresçam, mas apenas a norte desta. 

Percebe-se claramente que Setúbal é, no corpo definido por este território e a sua ocupação, o polo central nesta zona de charneira entre a AML e o Alentejo e a que podemos chamar Arrábida/Sado. Esta cidade deverá assumir, por isso, o papel natural de cabeça desta região. 

Mas a Arrábida/Sado necessitam de uma estratégia para potenciar o que têm de melhor para oferecer numa visão complementar de oferta de serviços e “pacotes turísticos”. Enunciamos, de seguida, alguns dos aspetos essenciais de uma estratégia para potenciar esta região. Destacamos apenas sete que poderão ser mais tarde desenvolvidas: 

I. Promover a região de forma complementar a Lisboa mas continuar a ela ligada – é, hoje, a maior marca de turismo em Portugal, tendo suplantado o Algarve – distinguindo os diversos “produtos turísticos” desta região singular; 

II. Formar mais e melhor todos os agentes envolvidos na atividade turística; 

III. Melhorar e diferenciar a oferta turística; 

IV. Recuperar os centros urbanos das magníficas vilas e cidades que a compõem, porque como percebemos pelo indicadores turísticos mais recentes “ o sol e praia” e a paisagem sem urbanidade de qualidade complementar de pouco valem; 

V. Requalificar ambientalmente o curso de água e incrementar a navegabilidade do Sado, pelo menos até Alcácer, envolvendo a industria e a agricultura nesse objetivo, aproximando as duas margens do Estuário envolvendo os diversos agentes nesse esforço, porque Setúbal e Troia ganhavam; 

VI. Tornar a paisagem mais acessível e sustentada, seja ela: natural, marítima, fluvial, florestal e agrícola, ordenando caminhos e embarcações e mapeando e abrindo à atividade económica esse potencial ainda pouco explorado (observação da natureza, desporto ao ar livre, adegas, vinhas, arrozais , pesca e náutica de recreio, etc.) ; 

VII. Apostar no turismo de saúde e no desenvolvimento dos serviços de geriatria e de saúde ligados à terceira idade, pois só assim poderemos atrair a terceira idade da europa e do mundo para esta região. 

Poder-se-á assim potenciar uma região que se afirma em diversas áreas (portuária, industrial, vinícola) que também podem contribuir para melhorar a qualidade de vida de todos, através de uma estratégia clara em torno do turismo. 

sábado, agosto 23

Retornados II

O nosso percurso de retorno não foi igual ao da maioria. Voltamos à "Metrópole" um pouco cedo, em abril de 1973, por força da doença da nossa mãe. O pai só veio definitivamente mais tarde, de "graciosa" na Primavera de 1975, para não mais voltar a África, deixando tudo o que tínhamos por lá. Os tempos já estavam perigosos. Eu com apenas dois anos e meio,então, era o mais novo dos três irmãos. Dois rapazes e uma rapariga. Nós, os filhos, vivemos durante esses dois anos espalhados por familiares, enquanto a nossa mãe, internada, "esperou" pela regresso do pai para melhorar. Só então agrupamos a família nuclear, no final do verão de 1975,  já em Setúbal.

Mas mesmo com estas diferenças, sempre nos sentimos e fomos tratados como "retornados". E dadas as diferentes nomenclaturas encontradas, parece-nos ser o termo mais adequado na nossa situação. 

Os nossos progenitores tinham ido para Angola em consequência da profissão escolhida pelo pai. Como militar "serviu" pela primeira vez a pátria assim que o velho senhor proferiu a necessidade de para lá ir "depressa e em força". Embarcou logo em 1961. Mas só na sua "segunda comissão", como então se designavam as temporadas de guerra, os dois foram já casados, esperando a primeira filha, que nasceu em Setembro de 1965, em Luanda.

Nada, há partida, indicava que a vida dos nossos pais viria a passar por Angola, não fosse a profissão escolhida pelo pai e a circunstância histórica do início da guerra colonial se ter desenrolado. Ambos eram de famílias nascidas, criadas e falecidas no Alentejo raiano, entre Elvas, Estremoz e Vila Viçosa.  Gente essencialmente ligada ao mundo rural, no caso da família do pai e também ao comércio, no da mãe.

A ida dos nossos pais para África e o facto de nós ainda termos nascido num velho império e o único  que se mantinha foi, por eles, sentida como natural. Sendo um acontecimento determinado pela história particularmente tardia do país, nunca tiveram essa percepção. Eram pouco ou nada politizados à época. No seu entender tinham chegado a uma terra, que apesar de longínqua, sobre todos os pontos de vista,  passou a ser a deles. 

Por isso, não é de estranhar que quem lá estava nunca tenha querido construir uma "casa de sonho" na sua aldeia...conforme refere e bem Helena Matos nos seu artigo, por comparação com os emigrantes para outra regiões da Europa e do mundo. Ninguém desejava voltar ao sitio onde não tinha sido feliz. Porque África foi, para todos estes portugueses, fossem ricos ou pobres, um Portugal melhor. Um outro país...esse sim de sonho. Os nossos lá, sentido-se portugueses, sentiam menos Portugal. O país pequenino, medíocre, fechado e sem horizontes nem esperança de mudança, de repente crescia, tornava-se afável e muito mais interessante.  Ninguém queria voltar, obviamente. 

Até o pai,  que sendo militar operacional durante seis anos na guerra- só em 1968 passou à vida civil - e conhecendo bem o preço que se pagava para se viver no paraíso, nunca pensou em voltar. Mesmo quando em 1973 a mulher e o seus três filhos vieram para a Metrópole ele manteve-se firme no seu posto, acreditando sempre que logo que esta melhorasse voltariam todos a casa. E a casa era em Angola, claro está.


Nessa altura já estávamos em Serpa Pinto, atual Menongue, capital do distrito do Cuando-Cubango, duas vezes e meia o tamanho da Metrópole, conforme me diziam os crescidos de lá, sempre que me encontravam cá, em pequeno. Nas terras do "fim do mundo", acrescentavam de seguida. Terras essas que o pai calcorreou de ponta a ponta nas suas novas funções de chefe de posto da Emissora Oficial de Angola, como se chamava a radio por lá. A instalar os postos de (re) transmissão, indispensáveis à eficaz cobertura de tão vasta região.  Fui o único dos irmãos que aí nasceu. O mano e a mana eram de Luanda, a capital da província de Angola. 

Regressado com dois anos e meio e não tendo recordações diretas, acabo por ter uma ideia viva desses tempos fruto da memória coletiva transmitida pela família e amigos. Construída especialmente durante a infância onde boa parte da comunidade de amigos eram também "retornados". Não só os dos pais mas também os meus conseguidos no sítio para onde fomos morar em Setúbal. Pois para além do bairro ser de toponímia exclusivamente colonial, o prédio onde cresci era constituído, quase em exclusivo, por gente vinda de África. Maioritariamente "brancos". Assim tivemos a sorte, pensamos, de ter crescido com uma infância quase africana no extremo do Bairro do Liceu, em Setúbal. 

Muita rua, muita brincadeira, muita abertura. Numa transição que foi (quase) pacífica podemos dizer. Apesar da nossa porteira daqueles tempos (setubalense de gema) nem sempre aceitar aquela energia tropical, dentro do prédio, com muita tranquilidade. A integração na escola foi fácil e passados os primeiros anos, pelo menos ao nível do miúdos, já nada nos diferenciava. Apenas a história recente da família e a memória que esta nos dava de um horizonte mais largo, que a maioria dos que nos circundavam não tinham. O que ainda hoje sinto, em praticamente todos, os que sei ou venho a descobrir que por lá nasceram...  

Tendo perdido tudo ou quase, no que diz respeito a bens materiais e perspetiva de vida, os retornados deram a volta às suas vidas.E estes foram o setor social (não se  pode falar em classe ou outra tipologia para além da geográfica) que efetivamente mais perdeu com a consequência mais imediata da revolução de Abril: a descolonização. Os "ricos" e os saneados do antigo regime podem ter perdido muito, mas a sua dimensão não é comparável.

Talvez por essa razão, não sei, encaro o que estamos a viver com alguma tranquilidade. Não tendo sentido o trauma que, por exemplo, tornou o pai diabético aos 36 anos, quando retornou, percebo que muita gente sinta também que o mundo desaba debaixo dos seus pés. No entanto, vimos que então como agora, o mundo não acaba, pelo menos para os que continuam vivos. E sempre novas janelas se abrem enquanto algumas portas se fecham...mas sobre isso falaremos em Retornados III... 

sexta-feira, agosto 22

Retornados I

A propósito do excelente artigo escrito por Helena Matos (HM), hoje no "Observador", ocorreu-nos contribuir um pouco para esta história, escrevendo sobre isso na primeira pessoa. O período retratado por HM é o de entre o 25 Abril de 1974 e o chamado "Verão Quente" de 75, onde os "retornados", como passaram a ser chamados, voltaram de forma mais expressiva.  A "ponte aérea" que os fez aterrar massivamente na Portela, não permitiu serem mais ignorados, como tão bem explica HM no seu artigo. 



O flagelo da descolonização que fez regressar mais de meio milhão de pessoas em menos de dois anos, funcionou como um início do fim da festa que foi esse primeiro ano de revolução. Mas neste caso as pessoas que voltavam não eram os ricos, filhos de família e/ou oportunistas que se tinham "governado" durante mais de quarenta anos de ditadura e que já tinham sido saneados. Estes eram os seus irmãos, de sangue ou de armas, que voltavam. Mas não deixavam estes de representar uma ameaça.  Como representou sempre quase tudo o que vinha de fora ameaçando  a miséria que sempre sobrou no Portugal continental. Poucos foram os que voltaram ao pequeno espaço luso metropolitano durante os longos cinco séculos de império. Saiam para não mais retornar. 

Mas tendo Portugal ficado, pela primeira vez, confinado ao pequeno retângulo europeu, a estes portugueses em perigo de vida restou, para a grande maioria, retornar. Foi o que fizeram...Mas, inicialmente, com muito pouca visibilidade, pois na grande festa revolucionaria dificilmente cabiam mais deserdados do que os já identificados: os ricos, os oportunista, os bufos, os exploradores e... os colonialistas. Foi, aliás, neste último epíteto, que muitos passaram a colocar os "retornados" do Ultramar. Não fomos, inicialmente bem recebidos, pois para além de sermos muitos e termos perdido tudo, ou quase, passamos a ser uma outra face da moeda boa, que tinha cunhada a queda do Estado Novo.  A descolonização foi, assim, uma espécie de culpa velada do novo regime. Do qual nunca nenhum dos envolvidos gostava particularmente de falar.

Pensamos, e para que não fiquem quaisquer dúvidas, que a responsabilidade desta descolonização descontrolada se deveu à falta de realismo histórico do Estado Novo, particularmente a partir dos anos 60.  

Assim como temos o orgulho em considerar que um dos grandes feitos do Portugal contemporâneo e dos portugueses nestes últimos 40 anos foi absorver toda esta gente sem terem ficado cicatrizes visíveis. Apesar do manto de silêncio. Sendo, por isso, em nossa opinião um assunto resolvido. Podemos mesmo afirmar que boa parte dos "retornados" e dos seus filhos e netos estão em melhor condição de vida material e sócio/profissional que a maioria dos seus familiares que nunca de cá saíram (dava um bom tema de investigação). O que adquiriram com a mudança de ambiente foi bem mais importante do que aquilo que lá deixaram. Pela observação que fazemos acerca deste tema, há anos a esta parte, assim parece ter acontecido. O que demonstra que mais importante que os bens materiais que se perderam, foram as aprendizagens, o novos horizontes e as novas relações pessoais  que a experiência  existencial proporcionou. O que só confirma e atesta este sucesso coletivo. No entanto, só agora se começa a ver alguma reflexão coletiva sobre este fenómeno, onde este artigo de HM, a interessante série exibida no ano passado "E depois do adeus", ou "Os últimos filhos do Império" no Público, são alguns bons exemplos.  





Não deixa de ser curioso refletir-se sobre a descolonização justamente num novo  tempo de "ajustamento" (uma nova forma de viver revolucionariamente sem golpe de Estado) da nossa sociedade e economia. Mas já não acreditamos em coincidências, pois alguma semelhança existe entre estes dois períodos, salvaguardadas as devidas distâncias, claro está.

Uma delas é o desmoronar do mainstream nacional que se constituiu no início do novo regime e que está a perder terreno no país. Sim porque parte do que se vive atualmente está a originar, entre muitas outros efeitos, uma mudança de protagonistas. Uma substituição de elites mas sem golpe de Estado. Mudança imposta de fora mas mesmo assim reformista. A "Geração 25" (G25), como já lhe  chamamos, está finalmente a ser substituída. Boa parte desta atingiu, quase sem saber ler nem escrever, ou pelo menos com muito pouca experiência e conhecimento de vida, o poder e os lugares de responsabilidade do Estado, das empresas e da sociedade e só agora está, após mais de 40 anos (novamente esse número cíclico) a começar a sair de cena. Com muita dificuldade mas está. Pois esta geração, ou pelo menos a sua elite aos mais diversos níveis nunca perdeu. Ganhou sempre, uns mais outros menos, uns mais honestamente outros menos, mas foi sempre vencedora. Só agora vê parte dos seus ídolos saírem de cena e com eles desmoronar-se o seu mundo. Sem revolução de forma mais serena mas igualmente real. Mas não irão sair sem dar luta...apesar da falta de dinheiro e a passagem do tempo não lhes seja favorável.

Não deixa de ser interessante que o protagonista mais visível dessa nova mudança  histórica seja ele um "retornado". Mas essa parte da história deixamos para mais tarde...agora vamos dar o nosso contributo pessoal sobre a nossa estória de retornado...(continua em Retornados II) 


sábado, agosto 16

Universidade de Lisboa sobe espetacularmente no Ranking de Xangai




Fonte: Público


O ranking de Xangai foi criado há uns anos atrás com o objetivo de hierarquizar todas a universidades do mundo, por áreas temáticas do conhecimento e por um índice agregado destas que as classifica globalmente.

O país deve ficar muito satisfeito porque a junção da Universidade Técnica com a Clássica, dando origem à Universidade de Lisboa, já deu os seus frutos. A instituição passou a estar entre as 250 melhores do mundo no ensino superior e entre as 80 melhores a nível europeu, numa tabela que continua a ser liderada pelas suas congéneres norte-americanas de Harvard e Stanford, MIT e UC Berkeley.

A Universidade de Lisboa volta a surgir também no grupo das melhores na área da Engenharia/Tecnologia e Ciências da Computação, onde o IST tem larga contribuição, seguindo-se depois a Universidade de Aveiro e a do Porto.

Estes rankings valem o que valem, mas fico muito satisfeito pois fiz todo o meu percurso na UTL (atual UL) - faculdade de arquitetura, licenciatura e instituto superior técnico, mestrado e doutoramento - e fui visiting scholar por duas vezes (2009 e 2011) em UC Berkeley (no Center for Cities & Schools), que se mantém como uma das top five do mundo.