sábado, março 28

Arame farpado


[__um fio de gestos fechados__]

bruno silva

2009



Sentimos um certo respeito e fascínio pelo arame farpado. Sempre nos intrigou a sua existência. O porquê da sua existência. Um arame interrompido por uma abrupta circunstância, farpado, que nos assusta que nos arrepia é inesquecível. Esta foi a nossa primeira experiência de fronteira, de limite territorial. Ainda hoje ela nos intimida nos agride como algo que nos limita a liberdade. Ou antes, torna a liberdade hesitante, temerosa próxima de algo sofrível.

No campo o arame farpado foi-nos apresentado como limite de propriedade, algo que não pode e não deve ser ultrapassado. Conhecer isto na infância torna esta imagem mais forte. Muito próxima. Ainda hoje, apesar de compreender, nos intriga o facto de o nosso primo ser açoitado pelo pai, por se ter cortado no arame farpado. Um duplo castigo sobre a inocência de um desafio. Ambos queríamos apenas brincar. E desta brincadeira surgiu a vontade de ultrapassar o perigo de vencer o medo, de ir para além do que é nosso. Do que é permitido.

A fronteira e o limite existem. Estão lá. Sempre lá à nossa espera. Mas é bom que existam porque nos confrontam, nos submetem ou nos fazem transcender, com mais ou menos cicatrizes as barreiras da vida, sem as quais seriamos infinitamente menos humanos. Quem nunca viu e/ou transpôs o arame farpado é com certeza mais limitado. Quem nunca se deteve sobre o risco de o transpor é mais pobre de vida. Menos consciente de si. Mais intolerante com os outros.

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