quarta-feira, dezembro 8

A Costa dos Murmúrios

É um filme triste. Honesto. No olhar, de uma mulher de “magala”, em fim de festa, que transmite. Fez-me compreender um outro lado da fase final da nossa colonização africana. Menos romântico, sem dúvida mas importante para a história. O da mulher que espera, com esperança, ou sem ela, o regresso. De uma outra vida, ou da morte.
Consigo perceber, hoje, melhor o convívio e a entrega permanente entre todas as pessoas, que ouvi nas histórias de família. A abertura de espírito e de hábitos é, num meio hostil uma resposta quase inevitável. Sem ninguém conhecido por perto todos se tornam mais abertos e tolerantes. A convivência torna-se uma fuga ao desenraizamento forçado ou desejado. O filme toca tudo isto mas numa perspectiva de desencanto, de desalento. Os protagonistas – um casal jovem e universitário – que se encontra com a guerra. Ele soldado na frente de batalha, ela recém casada e sozinha num território que começava a não ser “nosso”. As adversidades da vida e da guerra, acabam por fazer o resto… e o enredo não acaba bem.
Africa não foi só isto. Significou para muitos um encontro com outros horizontes, mesmo para os que foram para a guerra. Uma lufada de ar fresco, na vida mesquinha e sem perspectivas, em que a generalidade da “metrópole” vivia. Outra claridade e também uma noite mais escura. Terra de contrastes, mas de fascinante. Para muitos significou uma perspectiva de vida melhor, apesar da guerra. Essa era no essencial a minha percepção aquilo que os meus me contaram. Regressado com dois anos e meio, a minha memória desses tempos é a memória dos outros. Sendo dos outros e contada a uma criança a narrativa dos factos tende a ser “dourada” e romanceada. Omitem-se os medos e as perplexidades.
Este filme trouxe à nossa memória colectiva a tristeza daquela circunstância. E essa não se conta a uma criança. Depois de tantos anos, penso que já estamos maduros para a aceitar. Já sem nostalgia ou ódios - entre os que ficaram e os que retornaram - outros entendimentos sobre a nossa relação com África são agora possíveis e desejáveis. Penso que estamos mais crescidos para começar a ajustar contas com o passado. Este filme é disso prova.
A não perder.

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