quarta-feira, outubro 28

Será bom não termos ilusões...



A “avaliação dos professores” (AP) será um teste importante para a acção futura deste governo e para a evolução do país. As reformas que temos de fazer serão possíveis? Passo a explicar:

A AP foi um processo complicado, quer político quer prático, que começou com a aprovação do novo estatuto da carreira docente (ECD) e a divisão dos professores em duas categorias – professor e professor titular. Os dois processos estão ligados apesar de poderem ser separados. Independentemente do processo a percepção geral da população é de que os professores, como todas as profissões, devem ser avaliados. Os professores e os seus sindicatos disseram o mesmo – avaliação sim este modelo não.
Das últimas eleições resultou que todos os partidos da oposição são contra este modelo e têm a maioria no parlamento. Só o partido do governo o suporta. Na nova circunstância política a oposição prepara-se para testar o “novo” governo e o novo parlamento justamente com a AP. Este teste vai ser indicador do que se passará no futuro próximo porque irá indicar as qualidades da oposição e do governo para o país.
A divisão da carreira em duas categorias tinha dois objectivos: diferenciar e poupar. Criando duas categorias com limite de 1/3 para os professores titulares, limitava-se o acesso ao topo das remunerações a uma boa parte da classe, obrigando-a a diferenciar-se por essa via, o que acontece em todos os sectores profissionais. Os professores e os professores titulares também ganharam funções diferenciadas sendo os primeiros mais dedicados ao ensino directo e os segundos mais voltados para a organização e gestão das escolas.

Esta medida teve e terá no futuro um importante efeito na contenção da despesa pública para além de ter um efeito moralizador do sistema – nem todos têm qualidade/capacidade para chegar ao topo da carreira, como acontecia até então. Independentemente dos critérios para aceder a professor titular poderem ser melhorados, a hierarquização da carreira docente parece-nos indispensável. Se a igualização promovida pelo anterior ECD se mantiver voltaremos atrás. E o que se passará é que a classe passará a ser toda mais pobre sem qualquer benefício para quem se destaca. Não compensar o mérito é nivelar por baixo, não promover a excelência, como aconteceu anteriormente.
Independentemente das necessidades de aperfeiçoamento a actual AP tem um mérito: pretende diferenciar. Para o fazer a avaliação tem de ter efeitos na carreira. Se não diferenciar a avaliação é uma ficção como o era a anterior avaliação de professores. Se este princípio de diferenciação se afastar tudo o que diz respeito à avaliação estará definitivamente perdido.

Mas atenção se a AP se tornar uma ficção ou se for definitivamente eliminada, quem mais vai perder são os professores para além de, indirectamente, o ensino em geral. Será difícil aceitar que quem faz da sua profissão avaliar os outros não queira ser avaliado. Se isso acontecer como poderão considerar a sua actividade legítima e respeitável se a sua própria classe não aceita ser avaliada. E como olharão para os professores os alunos e suas famílias depois de isso acontecer? Com menos respeito seguramente. E como se sentirão os profissionais aplicados que estiveram envolvidos em todo este processo se tudo agora for mandado para o lixo? A frustração será enorme. Se a vitória da classe for revogar este modelo de avaliação e o ECD, voltando ao que tínhamos antes, essa vitória terá sobre a mesma um amargo efeito nos próximos anos.
Mas pior serão os seus efeitos sobre o futuro do país. O sector da educação e a restante acção governativa ficarão muito comprometidos. Por isso o que agora acontecer será exemplar para o que vier a seguir. Se esta reforma, em vez de aperfeiçoada, for apenas revogada estaremos a adiar o nosso futuro. Outras mudanças terão de acontecer para nos adaptarmos a um mundo novo para o qual estamos mal preparados. Muitas reformas têm de ser realizadas para nos colocarmos no século XXI. Se no primeiro teste o parlamento e o governo adoptarem a desistência como método é caso para perguntar se será Portugal irreformável nesta conjuntura e/ou neste sistema?

Se assim for o caminho é o empobrecimento e envelhecimento geral do país. Os mais novos, melhores mais dinâmicos e menos instalados tenderão a sair, como já está a acontecer (100 jovens licenciados por mês segundo um jornal). Como sempre aconteceu na nossa história. Os que se mantiverem ficarão alegremente mais pobres e mais velhos. O que se deu no nosso interior, especialmente no Alentejo em relação ao restante país acontecerá ao país, em relação á Europa. Será bom não termos ilusões...


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